A Comissão Especial de Inquérito (CEI) da Câmara Municipal de Natal, que apura as invasões a imóveis públicos, privados e estabelecimentos comerciais na capital potiguar, concentrou os trabalhos desta quarta-feira, 22, em questionamentos sobre uma possível ligação entre os movimentos sociais e o Governo do Estado. O foco principal foi a concessão de passagens aéreas, no valor total de quase R$ 20 mil, por meio do Gabinete Civil, para membros do Movimento de Mulheres Olga Benário e do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) viajarem a São Paulo e Rio de Janeiro em 2024 — ano de eleições municipais.
Durante as oitivas, o relator da comissão, vereador Matheus Faustino (União Brasil), afirmou que irá requisitar ao Gabinete Civil documentos que comprovem a finalidade oficial dessas viagens, custeadas com recursos públicos. “Queremos saber se de fato estavam em eventos oficiais. Toda viagem institucional tem provas objetivas, como credenciais, registros fotográficos e lista de presença”, disse.
As coordenadoras dos dois movimentos, Kívia Moreira Nunes (Olga Benário) e Bianca Soares Evangelista (MLB), prestaram esclarecimentos à CEI. Ambas justificaram que participaram de reuniões sobre o programa Minha Casa, Minha Vida e ações voltadas à formulação de políticas públicas para mulheres em situação de vulnerabilidade. No entanto, o vereador Faustino questionou a contratação da agência de viagens Araruana, do Mato Grosso do Sul, para as cinco passagens, apontando a preferência por prestadoras locais: “É curioso que se tenha usado uma empresa de fora, quando há agências potiguares que poderiam realizar esse serviço”.
Faustino apresentou documentos que mostram que, em julho de 2023, Kívia Nunes recebeu uma passagem no valor de R$ 3,2 mil para ir ao Rio de Janeiro enquanto atuava na campanha eleitoral de Bianca Soares. Em resposta, Kívia declarou: “É muito legal, porque fui discutir políticas públicas para mulheres. Defendo que o espaço público seja ocupado pelo povo, e a viagem foi concedida com essa finalidade”.
Outro ponto de tensão durante a reunião foi a relação entre o MLB e redes de supermercados. O presidente da CEI, vereador Subtenente Eliabe (PL), questionou Bianca Soares após o representante da Associação dos Supermercados do RN (Assurn), Eugênio Medeiros, afirmar que não havia comunicação prévia sobre as ocupações em estabelecimentos comerciais. Bianca rebateu dizendo que o movimento envia ofícios solicitando doações antes das ações, mas reconheceu que “isso não quer dizer que haja uma autorização ou que informemos previamente que vamos ao supermercado. Até porque não é necessário autorização para ir a um estabelecimento”.
Eugênio Medeiros afirmou que as ações resultaram em prejuízos milionários às empresas, sobretudo por lucro cessante e perturbação da rotina de consumidores e trabalhadores. Ao ser questionado pelo vereador Daniel Valença (PT) sobre o caráter antidemocrático das invasões, Medeiros respondeu que “não cabe julgamento”, mas reforçou que o comércio é sensível às demandas sociais e colabora institucionalmente quando possível — “contudo, a invasão de espaços produtivos causa impactos sérios”.
Ao fim da sessão, o presidente da CEI anunciou o adiamento do depoimento do militante do MLB, Marcos Ribeiro.


